Um dos pontos mais importantes do Programa Nacional de Direitos Humanos, criado por decreto assinado pelo presidente da República – e que tanta celeuma está causando nos meios militares – é a proposta de retomada da discussão sobre a união civil entre pessoas do mesmo sexo.
Este é um debate crucial, que não pode ficar restrito ao Congresso Nacional, que deverá votar uma lei para regular o assunto.
É uma discussão que interessa a toda a sociedade brasileira.
É uma discussão que interessa a toda a sociedade brasileira.
O século XX foi o século da luta por direitos civis. Começou, a rigor, no século XIX, com a luta pelo voto feminino.
A Nova Zelândia foi o primeiro país a conceder o voto às mulheres, em 1893; a Inglaterra em 1918, os Estados Unidos em 1920 e o Brasil em 1933.
Em seguida, a luta disseminou-se para combater a segregação racial, ampliar os direitos da minorias, incluir os excluídos. A partir da década de 1960, acirrou-se a luta por mais direitos civis, com muitas conquistas importantes.
E chegamos ao século XXI.
De certa forma, a eleição de Lula em 2002 e depois a eleição de Obama em 2008 encerram um importante capítulo na luta pelos direitos civis.
Vitória da inclusão, da tolerância, da aceitação do outro, do convívio entre diferentes.
Agora é preciso avançar. E a união civil entre pessoas do mesmo sexo está na ordem do dia.
Vários países já adotam legislação que reconhece esta união.
O pioneirismo, é claro, coube à Escandinávia. Na Dinamarca, a lei é de 1989; na Noruega, de 1992, e na Suécia, de 1995.
Ainda na Europa, Espanha, Portugal e Bélgica (países fortemente católicos) já reconheceram a união civil. A Holanda também já tem legislação a respeito.
Nos Estados Unidos a legislação é local, e várias cidades já possuem leis a respeito da união homossexual, além dos estados de Massachusetts e Connecticut.
Canadá e México também já reconhecem a união civil.
Na América do Sul, Uruguai e Argentina já aprovaram a lei. A Argentina foi a pioneira na realização de um casamento gay.
Aliás, no Brasil, como em muitos países, o debate foi contaminado, em grande parte, pela adoção da infeliz expressão “casamento gay”.
Religiosos de todas as igrejas, conservadores de todos os matizes reuniram-se para impedir a aprovação de lei que regule a união homossexual.
A Constituição brasileira de 1988 fala, em seu Art. 226, em casamento e em união estável, mas sempre entre homem e mulher.
Em 1995, a então deputada Marta Suplicy apresentou o projeto de lei nº 1.115/95, em favor da regularização da parceria civil entre pessoas do mesmo sexo.
Desde então, o projeto dorme em alguma gaveta da Câmara dos Deputados, à espera de algum deputado (ou deputada) sério e corajoso o suficiente para fazer avançar a legislação.
Antecipando-se a qualquer lei, várias empresas brasileiras já estendem ao companheiro de mesmo sexo os benefícios de planos de saúde e de previdência.
Juízes igualmente já tomam decisões beneficiando companheiros de mesmo sexo em partilhas, heranças e pensões.
Até mesmo a Justiça Eleitoral já reconheceu, em alguns casos, a união homossexual como parte da lei das inelegibilidades.
Portanto, a discussão sobre direitos civis no século XXI precisa avançar. Até para honrar as lutas do século XX.
Está mais do que na hora de a sociedade brasileira realizar uma discussão ampla e aberta sobre a nova pauta dos direitos civis.
União homossexual, aborto e eutanásia são os temas do século XXI.
É preciso discuti-los com coragem e determinação.
Precisamos avançar.
Lucia Hippolito é cientista política, historiadora e jornalista, especialista em eleuções, partidos políticos e Estado brasileiro.
É comentarista política da Rádio CBN e da Globonews.