"E agora, José?
A reza acabou,
a presidência dançou,
o povo sumiu,
o escândalo esfriou,
e agora, José?
E agora, você?
Você que tem nome,
que zomba dos outros,
você que excomunga,
cala quem protesta,
e agora, José?
Está sem respeito,
está sem discurso,
está sem destino,
já não pode benzer,
já não pode empregar,
iludir já não pode,
a verba esgotou,
o milagre não veio,
o aplauso não veio,
o jetom não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua negra casaca,
seu instante de santo,
sua imortalidade,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de oligarca,
sua incoerência,seu trono - e agora?
Com a caneta na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no Maranhão,
mas o Maranhão secou;
quer ir para Roma,
João Paulo não há mais.
José, e agora?
Se você confessasse,
se você se arrependesse,
se você tentasse
ser igual a toda gente,
se você dormisse,
se você sonhasse,
se você morresse…
Mas você não morre,
você é eterno, José!
Sozinho entre os muros
príncipe em seu palácio,
só teologia,
sem verdade nua
para se perdoar,
você é o dono do mar
que fugiu a galope,
você foge,José!
José, pra onde?"
Por ROBERTO VIEIRA sobre poema de CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE